Eu te
perdoo mãe pelas surras que me deste na maioria das vezes sem merecer, aliás
não me lembro te ter merecido uma sequer, mas lembro-me das muitas que levei
houve um período em que apanhava todos os dias eu acordava com a certeza que
não dormiria sem apanhar muitas vezes ouvi isso de você, mas assim mesmo te
perdoo.
Eu era
uma criança tímida, educada, lembra mãe lá naquela região onde morávamos entre
oito e onze anos da minha idade o hábito era criança pedir benção de adultos
fossem eles: parentes ou não e com as mãos postas(juntas) eu o fazia. Eu fui
uma criança, um adolescente, um jovem e um adulto cheio de medos, recalques,
mas eu te perdoo mãe.
Eu dos
seis aos quinze anos acordava pedindo para morrer, pois não aguentava aquela
rotina de apanhar, apanhar eu não brigava na rua, não fazia arte na rua ou na
escola, lembra mãe naquele tempo não tinha esta coisa de chamar pai ou mãe na
escola o professor ou diretor mesmo batia, eu nunca levei sequer uma bronca na
escola, mas você me espancava sem motivo algum, mas repito te perdoo.
Os únicos
momentos em que um lampejo de felicidade entrava em meu coração, era quando aos
domingos ou dias de festas íamos para casa da vó, lá encontrava meus primos e
primas e eu esquecia que era um menino infeliz eu não comentava ou se comentava
ninguém dava bola, acho que nem meu pai um ser humano quase um anjo sabia do
meu sofrimento, mas eu te perdoo mãe.
Lembra
que aos seis anos de idade eu fugi de casa com minha irmãzinha, ela devia ter
quatro anos morávamos em uma área rural e fomos para a casa de nossa tia irmã
de meu pai, me lembro muito bem a paisagem mato queimado, tocos de carvão era
um terreno sendo preparado para plantio de milho e feijão chegamos final do dia
na casa tia e o marido dela nos levou de volta para casa, não me lembro se
apanhei naquele dia, mas se sim e te perdoo.
Eu
aprendi muito com esta vida martirizante que me impôs, aprendi a não ser tão
covarde com criança e jamais as agredir física ou moralmente, não deveria
passar para frente o que você fez comigo, ninguém merece apanhar sem poder se
defender e sem motivos pior ainda, e muitos casos os homens tratados assim na
infância tem raiva de mulher, eu sou fã da mulher e principalmente mães de
verdade, te perdoo mãe.
Você
sabia que eu por muito tempo tive que frequentar profissionais que tratam da
psiquê? Frequentei Psicanalista, Psicólogos, Psiquiatra e tomei por muito tempo
remédios prescritos a esta causa? E só consegui me livrar desta panaceia quando
estudei e entendi meu caso a origem de minha patologia (ah! Sou pós-graduado
hoje em Psicanálise Clínica por conta disso), então te perdoo mãe.
Você
sabia que fui virgem até os vinte e oito anos de idade? Não, eu não tinha raiva
de mulher eu tinha medo de não dar conta da mulher, não fazê-la ter prazer, eu
jamais iria me perdoar se falhasse nisto, portanto ficava ali na minha arrumava
namoradinhas, mas não passava de pequenos amassos, quando era para ir pra luta
eu caía fora, desistia, inventava qualquer desculpas, tudo traumas e recalque
da infância e adolescência, mas te perdoo mãe.
Hoje
não gosto muito nem de ouvir ou tratar do termo família, acho que por conta do
que passei, quem deveria ser minha protetora era minha algoza, sei que não sou
o único e nem o pior dos casos, mas felizmente tenho a chance de me desabafar
nestas linhas e sei muito bem que poucos tem esta chance, tambem por isso a
perdoo mãe.
Já
me livrei relativamente dos traumas e recalques desta infância e adolescência,
hoje estou aprendendo a não odiar e nem ter mágoas nem de quem me agride, me
maltrata ou me ofende de qualquer forma, estou me tornando vinho de boa classe
e não vinagre, por isso te perdoo mãe.
Hoje
tenho mais de seis décadas de idade muita coisa já vi, aprendi e descobri que
quanto mais aprendo, mais tenho a aprender e não teria nada aprendido se mesmo
não entendo suas razões não perdoar, por isso eu perdoo você.
Agradeço
imensamente pelos nove meses que me carregou, não sei nem me lembro como foi
minha gestação, imagino que difícil pois vivíamos em situação de pobreza por
isso eu te agradeço imensamente e te perdoo mãe.
Célio
Rheis
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